Os veículos de comunicação impresso norte-americanos começam a refletir mais fortemente sobre seu futuro. Em 2009, uma capa da revista Time versava sobre o assunto. Escrito pelo jornalista Walter Isaacson, o texto afirma que a estratégia comercial de liberar gratuitamente todo o conteúdo do jornal na internet e lucrar apenas com anúncios não está tendo resultados satisfatórios.
O exemplo emblemático desses novos tempos é o “The New York Times”, jornal de maior prestígio do mundo (o texto “End Times” reflete sobre isso). Seu site tem 20 milhões de visitantes únicos por dia (seis vezes mais que os leitores do jornal impresso). Entretanto, não é suficiente. O lucro da empresa caiu pela metade em um ano.
O jornal, que liberou todo seu conteúdo em 2007, estuda voltar a cobrar pelo acesso. Todavia, num mundo em que cada vez mais pessoas vêem a internet como território do gratuito, a proposta vai ser bem-recebida?
A TV é outra que se preocupa com as mudanças trazidas pela internet. A real ameaça aos canais pagos não é mais a pirataria “física”, através de ligações clandestinas, mas sim pela internet. Episódios disponibilizados em programas de compartilhamento de dados, como Torrent, Emule etc, e transmissões ao vivo via sites como Justin.TV mitigam a outrora onipresença da TV.
Os sites dessas emissoras possuem boas audiências (no Brasil, a Globo.com é uma das cinco páginas mais visitadas), o Hulu se mostra uma saída de sucesso para as TVs comerciais mas… É o momento de tentar pavimentar novos caminhos. É uma tarefa árdua: ainda estamos no período de transformação.
Já o escritor Henryk A. Kowalczyk acredita que o jornalismo precisa ser salvo, não os jornais impressos.
O debate sobre o futuro do jornalismo
"Quando alguém quer saber como vamos substituir os jornais impressos, elas realmente querem escutar que não estamos vivendo uma revolução. Eles querem que seja dito que os sistemas antigos não vão quebrar antes que novos surjam no lugar. Eles querem ser informados que as antigas barganhas sociais não estão em perigo, que as principais instituições serão poupadas, que os novos métodos de propagação da informação irão melhorar as práticas anteriores. Eles estão esperando uma mentira”.
Clay Shirky, jornalista e professor da Universidade de Nova York, no texto Jornais e pensando o impensável. Curiosamente, o texto foi publicado numa sexta-feira 13 (de março). A situação dos periódicos impressos nos EUA é bem pior que no Brasil.
Não faz sentido falar da crise da imprensa sem contextualizar o que está acontecendo. O mundo, em especial os EUA, vivem uma crise econômica. A imprensa é mais um segmento da economia que está sofrendo com ela. Além disso, há veículos que apresentam dificuldades anteriores. Não ver o todo fará com que causa se misture com conseqüência, tornando mais difícil encontrar novos caminhos.
No Brasil…A circulação média diária de jornais no ano passado cresceu 5% na comparação com 2007, de 4,14 milhões de exemplares para 4,35 milhões de exemplares, segundo o IVC (Instituto Verificador de Circulação). A circulação das revistas semanais cresceu 3% no mesmo período. Entretanto, no começo desse ano, a maioria dos jornais teve decréscimo.
De toda forma, esses números ainda são bem menores que os apresentados logo após o Plano Real, quando a tiragem alcançou índices bastante altos. Acima de tudo, é complicado tentar equiparar realidades tão distintas. No Brasil, ainda se fala em analfabetismo.
Entre as revistas semanais populares, o crescimento de circulação em 2008 foi de 11%. Os chamados jornais populares respondem por cerca de 50% da circulação média dos diários do país. Há espaço para crescer. Até porque a classe C aumenta no país.
O consumo diário de jornais no Brasil a cada mil habitantes é de 53 exemplares, segundo a Associação Mundial de Jornais. Valor bastante inferior ao do México, 148 exemplares. Nos Estados Unidos, o número chega a 241, e, no Reino Unido, 335 exemplares.
Há possibilidades de crescimento também nos jornais gratuitos. Enfim, há oportunidades. Precisamos de mais informações, dados, estudos sobre o que está acontecendo e menos histrionismo, ficar exacerbado diante de qualquer notícia que surja sobre a propalada crise do jornalismo.
Martin Sorell, um dos homens mais poderosos da publicidade, acredita que, em 2010, o preço da publicidade no papel vai cair tanto que haverá um renascimento. Jornais e revistas estarão incrivelmente atraentes por isso.
E estamos falando apenas da mídia tradicional. A discussão sobre a imprensa deve ir além do jornal impresso; deve-se buscar a diversidade de plataformas. O meio digital, o grande desafio atual, também oferece oportunidades. Enquanto se tenta escrever o epitáfio do jornalismo, perde-se a chance de criar novos caminhos para a informação. Como um médico que fala de doença, e não de saúde.
Crise na imprensa afeta publicações locais no Reino Unido e EUA
Segundo pesquisa do Enders Analysis, mais de um terço dos jornais regionais da Inglaterra devem fechar entre 2002 e 2013. Publicações locais já fecham numa taxa média de 10-15 por semana.
O estudo aponta que a atual desaceleração econômica e o impacto comercial da mudança do modelo de publicidade resultará, nos próximos cinco anos, em perda de metade dos postos de trabalho.
Como saídas, o estudo aponta flexibilizar a regulamentação no Reino Unido de atuação em diversas plataformas de comunicação. Uma empresa poderia comprar uma rádio, por exemplo. Dessa forma, os grupos ganhariam em escala de serviços, investindo no cross media. A solução, de toda forma, terá de vir dos próprios grupos de comunicação, visto que são apenas essas empresas que querem investir no setor.
Futuro incerto
Nos EUA, a situação é até pior, e não apenas nos grandes grupos de comunicação. A queda de receita com anúncios de TV nos grupos locais foi de 40% em 2008 em relação ao ano anterior (no Reino Unido, 25%). Os dados também são do Enders Analysis.
No caso norte-americano, a mídia local tem sido bastante afetada devido ao agravamento da crise da indústria automotiva, uma das maiores anunciantes.
A solução também seria flexibilizar as regras de atuação em diversos meios, passando a investir em várias plataformas de atuação. Algo que Rupert Murdoch, dono de numerosas empresas de comunicação, afirma há algum tempo: “O jornalismo está mudando, mas as empresas que investirem em novas formas de entrega de conteúdo vão prosperar”. Os meios de comunicação têm marcas fortes. E credibilidade pode valer mais que ativos tangíveis de uma empresa.
Evidentemente, é bom encarar com cautela tais previsões. Se prognósticos como esse estivessem sempre corretos, hoje em dia CDs não seriam produzidos. A sua morte foi decretada há um bom tempo.
A receita do Google para os meios de comunicação enfrentarem a crise
Eric Schmidt, presidente do Google, fez uma palestra, em 2009, à Associação dos Jornais dos EUA. Segundo ele, os meios de comunicação social devem se tornar plataformas: encontrar formas de entregar conteúdo numa época de abundância de informação, oferecendo aos usuários várias alternativas para ele se informar. Além disso, devem também investir em tecnologia, usando novas ferramentas e entregando conteúdo em diferentes canais e interfaces.
Os meios de comunicação também devem permitir que os usuários possam encontrar, utilizar e gerir esse conteúdo dentro de seus sites e através de redes sociais e outras ferramentas, como a API (application programming interface), permitindo espalhar e capitalizar os meios de comunicação através de aplicações e outras formas de visualização. Para ele, essa é uma das melhores maneiras de explorar esse novo mercado.
Para além do debate sobre conteúdo pago ou gratuito, Schmidt acredita que seja necessário combinar diversos modelos de negócios, para alavancar a “cauda longa” do mercado. Como vem fazendo a televisão (pagamento através de assinatura ou pay-per-view).
Outro ponto importante é que num mercado em abundância não se pode criar uma escassez artificial e, portanto, a publicidade vai continuar a ser a mais importante fonte de renda para os meios de comunicação. Se você obter retorno sobre o conteúdo gratuito ou pago, melhor (para o Google, inclusive). A audiência gerará mais verba publicitária. Uma receita de micropagamentos e assinaturas pode evoluir para um modelo freemium: livre com uma pequena proporção paga.
Schmidt acredita que é necessário correr. Agregadores de notícias e novas ferramentas como o Twitter estão ganhando a batalha para conseguir dividendos digitais.
O design pode salvar o jornalismo?
Jacek Utko é um design polonês que, com suas criações, conseguiu elevar a tiragem de muitos jornais (em alguns casos, em 100%). Para ele, a capa de um jornal funciona como um pôster. Como inspiração para seu trabalho, cita o Cirque du Soleil.
O jornal tem de ser gratuito, local, focar em nichos… São muitas idéias levantadas para salvar o jornalismo impresso. Ele argumenta que o design é utilizado apenas como um dos fatores para melhorar as publicações. Entretanto, o design deveria ser o ponto de partida para esse processo.
Segundo Utko, uma música tem ritmo, altos e baixos. O design tem de seguir pelo mesmo caminho, ser tratado como uma composição. “O design pode mudar tudo, uma empresa por inteiro. Até pode mudar você. E quem é o responsável? Os designers, dê poder a esses profissionais”, explica, rindo.
Você pode viver num país pobre, trabalhar numa empresa pequena. Pode trabalhar sem verba, equipe necessária, mas ainda assim pode elevar seu trabalho ao nível mais alto. Para isso, você precisa de visão inspirada e determinação. Ser bom no que faz não é o suficiente”, completa.
Assista o vídeo da apresentação que ele fez na TED aqui. Em inglês.
Acho simpática a visão de Utko e concordo com muitos pontos. Todavia, acredito que o designer tem um papel importante na concepção de vários produtos, mas não deve ser a maior preocupação. Na verdade, muitos fatores devem ser observados, tanto externos (design, texto instigante) quanto internos (gestão eficiente de custos, preços competitivos, desenvolvimento de projetos adequados, equipe talentosa etc.).
Um conjunto de ações, geralmente, é o mais apropriado. Do contrário, não estamos pensando o trabalho como um todo, mas sim correndo atrás de certezas que garantam soluções rápidas e definitivas. O que não há.